Fisioterapia Neurofuncional: foco na aquisição da marcha no paciente com lesão medular

A lesão medular (LM) é caracterizada pelo comprometimento de forma temporária ou permanente das funções motoras e sensitivas. 

Este comprometimento, dependendo do grau de lesão na medula espinhal, pode ser parcial ou completo. Entre essas alterações implicam diretamente no emocional e nas atividades do dia a dia destes indivíduos. 

Entre essas perdas, a marcha é um dos itens mais relatados durante a anamnese, dado pelo grau de liberdade que a mesma propõe. 

Para minimizar as perdas promovidas pela lesão medular estes indivíduos são inseridos em programas de reabilitação intensiva. A Fisioterapia Neurofuncional tem um papel fundamental neste contexto por devolver a funcionalidade, qualidade de vida e adaptar o seu desempenho frente às dificuldades geradas pela LM. 

Dentre o programa de reabilitação, um dos focos deste é a plasticidade neural caracterizada pela atividade realizada de forma rítmica e contínua que estimulam os circuitos neurais de controle da locomoção (chamado gerador central de padrões em nível medular), o que facilita a aquisição da marcha terapêutica, domiciliar entre outras modalidades.

O treino da marcha na LM oferece a este indivíduo ganhos funcionais e metabólicos como prevenção de osteoporose, melhora de crises hipotensivas em ortostatismo, na motilidade intestinal entre outros. Já no aspecto emocional, há um grande impacto positivo que interfere diretamente na qualidade de vida.

Para tanto, a Fisioterapia conta com alguns dispositivos que auxiliam estes indivíduos a desenvolverem e melhorarem a marcha após a lesão medular. 

Estes dispositivos promovem a extensão dos membros e dependendo do nível de lesão, estabilizam a cintura pélvica e o tórax. A seguir estão descritos mais utilizados e estudados para este treino.

Eletroestimulação

A estimulação Functional electrical stimulation (FES) é um método de ativação muscular que auxilia na marcha de pacientes com LM. 

As contrações coordenadas promovidas podem simular a marcha para os indivíduos. Estudos recentes mostram que pessoas com lesão medular incompleta têm a capacidade de melhorar a função de andar voluntário após terapia intensiva com FES a curto prazo. 

Pode-se usar a FES como um meio de fornecer uma terapia de locomoção restauradora para melhorar a neuroplasticidade espinhal e supra-espinhal, em vez de usá-la como um auxílio compensatório puro para caminhar.

Suporte parcial de peso

O treino locomotor com uso do suporte parcial de peso é um importante facilitador na reabilitação, principalmente para o indivíduo com LM incompleta, pois está relacionada com o aprendizado do novo padrão de marcha e a plasticidade neural, depende de inputs sensoriais associado a uma tarefa e de repetição em sua execução. 

O terapeuta auxilia o indivíduo durante as fases da marcha, realizando sempre a correção postural, facilitando assim para o paciente e terapeuta a efetividade da função com maior qualidade.

HKAFO (hip, knee, ankle, footorthesis)

O uso do HKAFO, mais comumente conhecido como o tutor longo, pode ser indicado para pacientes com lesão medular completa ou incompleta, é utilizado para facilitar o movimento e dar estabilidade durante a locomoção.

O dispositivo é feito sob medida e serve para facilitar tanto o controle como a correção, sustentação e estabilização de um determinado segmento corporal, proporcionando e favorecendo a função desse segmento durante o treino da marcha.

LION

O implante laparoscópico de neuromodulador, ou LION (Laparoscopic Implantation Of Neuroprothesis), consiste no implante de eletrodos nos nervos ciáticos, femorais e pudendo bilaterais, junto com um gerador de impulsos elétricos que irá estimular a área inervada.

Os estímulos dos nervos femorais promovem a extensão dos joelhos pela ativação do quadríceps femoral. 

O nervo ciático é responsável pela contração da musculatura glútea e de toda a musculatura posterior da coxa. Quando estimulada junto ao nervo femoral, promove a estabilidade dos membros inferiores, firmeza nos pés e quadril, possibilitando ficar em pé apenas com a ativação do aparelho.

Devido a estabilidade promovida pelo LION, o treino locomotor é possível com uso de barras paralelas e aditamentos, por exemplo, andador e muletas canadenses. O treino pode evoluir em alguns casos para marcha terapêutica, domiciliar e comunitária.

O Increasing possui todas essas possibilidades terapêuticas, além de serem utilizadas em conjunto para aumento do desempenho e melhora no quadro motor.

Por:

Dra. Alyne Lima Barbosa, Neurofuncional CREFITO  3/ 229672 – F
Dr. Felipe Fernandes Lemos, Neurofuncional CREFITO  3/69760 – F
Dra. Simone Minae Yoneyama, Neurofuncional CREFITO  3/95909 - F
Dr. Victor Croos Bezerra – Neurofuncional / Aquática CREFITO  3/ 227403 - F

Referências 

Souza Francine Bertolais do Valle et al. “Benefícios da marcha com assistência robótica na lesão medular: uma revisão sistemática”. Acta Fisiatr. 2013;20(3):142-146

Dutra, Cristina Maria Rocha et al. “Treino locomotor com suporte parcial de peso corporal na reabilitação da lesão medular: revisão da literatura. Fisioterapia em Movimento”. [online]. 2013, v. 26, n. 4

Nam, Ki Yeun et al. “Robot-assisted gait training (Lokomat) improves walking function and activity in people with spinal cord injury: a systematic review.” Journal of neuroengineering and rehabilitation vol. 14,1 24. 23 Mar. 2017, doi:10.1186/s12984-017-0232-3

Kapadia, Naaz et al. “A randomized trial of functional electrical stimulation for walking in incomplete spinal cord injury: Effects on walking competency.” The journal of spinal cord medicine vol. 37,5 (2014): 511-24. doi:10.1179/2045772314Y.0000000263

Rocha, Camila Antunes et al. “Treinamento da marcha em lesão medular T1 asia c: Um estudo de caso sob a perspectiva da CIF”. Uniformg, conexão ciência, v. 10 n. 1 (2015).

Possover Marc. “Recovery of Sensory and Supraspinal Control of Leg Movement in People With Chronic Paraplegia: A Case Series”.Archives of Physical Medicine and Rehabilitation 2014;95:610-4

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