O que é LION? (parte 3): fases do tratamento


 

Dando continuidade à nossa série que explica o que é o implante laparoscópico de neuromodulador – ou LION (Laparoscopic Implantation Of Neuroprothesis) –, hoje falaremos sobre as fases do tratamento.

O tratamento LION é divido em três fases: preparo pré-operatório; cirurgia e pós-operatório inicial; reabilitação pós-operatória.

Fase 1: preparo pré-operatório

O objetivo da fase 1 é preparar o paciente física e psicologicamente para as demais fases. 

Um dos principais objetivos do preparo pré-operatório é treinar o paciente e seus cuidadores para o período pós-operatório inicial, com o intuito de prevenir a complicação mais frequente do procedimento LION: o deslocamento de eletrodos. 

Esse deslocamento ocorre, principalmente, durante transferências e outras movimentações onde ocorre a torção exagerada do tronco. Durante esta fase, a Fisioterapia Neurofuncional e a Terapia Ocupacional atuam treinando o paciente e seu cuidador para executar suas atividades diárias evitando movimentos de risco, sobretudo nos três meses de pós-operatório.

O trabalho psicológico é essencial nesta fase, pois ajuda a equipe de Neuropelveologia a esclarecer ao paciente suas expectativas em relação ao tratamento. Além disso, é nesta fase que o paciente conhece outros já operados e começa a entender de forma mais aprofundada o procedimento ao qual será submetido.

Ao mesmo tempo, é realizado um intenso trabalho de preparo físico para a reabilitação pós-operatória. Alongamentos e outras estratégias para ganhos de mobilidade articular são implementadas; exercícios respiratórios e motores são realizados para promover melhor controle de tronco e desempenho cardiovascular, a fim de otimizar os ganhos no pós-operatório.

Nesta fase, a disciplina, a motivação e a capacidade de aderência ao tratamento também são postas à prova, com uma rotina de treinamento e fisioterapia diárias. Assim, esta etapa serve também como triagem final para saber se o paciente tem de fato boas perspectivas em relação ao procedimento LION. 

Cerca de 10% dos pacientes desistem ou têm o procedimento contraindicado nesse período do tratamento.

Fase 2: perioperatório

Ao final da fase 1, quando o paciente tiver atingido todas as metas pré-operatórias, iniciam-se os cuidados pré-operatórios. 

Esta fase caracteriza-se por uma série de medidas que garantam uma significativa redução global dos riscos do procedimento cirúrgico. Neste momento serão necessárias algumas consultas médicas, dentre elas, uma com o anestesiologista que estará presente no momento da cirurgia e outra com o infectologista da equipe médica.

Alguns exames complementares serão solicitados neste momento:

  • Coletas de sangue e urina para culturas e avaliação da saúde geral;
  • Estudo urodinâmico para a avaliação da função urinária previamente à cirurgia;
  • Exames de imagem, de acordo com a indicação clínica e fatores de risco do paciente;
  • Cultura das bactérias de regiões como mucosas da boca, axilas, virilhas e região perianal. Estas amostras são coletadas com cotonetes, na pele destes locais. 

O objetivo é mapear toda a flora bacteriana de todo o corpo do paciente, a fim de orientar a escolha do(s) antibiótico(s) adequado(s) para ser(em) aplicado(s) antes da cirurgia e durante a internação, visando prevenir infecções.

Cumpridas estas etapas, a cirurgia será agendada. 

Os processos de agendamento serão realizados pela equipe administrativa e de enfermagem do INCREASING. A escolha do hospital, o agendamento e a solicitação de materiais serão feitos por nossa equipe, que permanecerá sempre à disposição do paciente para mantê-lo informado e tirar todas as dúvidas relativas a este processo. 

A colaboração do paciente e de seus familiares pode ser necessária para atender a possíveis solicitações do setor administrativo neste momento.

Em paralelo, a equipe clínica prestará todos os esclarecimentos sobre data e horário da internação e cirurgia, cuidados pré-internação, jejum, itens pessoais a serem levados ao hospital e quaisquer outros questionamentos do paciente e seus acompanhantes. 

O termo de consentimento cirúrgico deve ser assinado nesta ocasião. Este documento será entregue ao paciente lido em conjunto com a equipe. Nele constam informações detalhadas sobre a técnica cirúrgica, riscos e benefícios da realização do procedimento. 

Em geral, a leitura do termo de consentimento cirúrgico gera novas dúvidas, que serão sanadas neste momento. Sua assinatura certificará que o paciente compreende e está de acordo com a realização do procedimento LION.

A internação hospitalar geralmente se dá algumas horas antes do horário agendado para a cirurgia. No entanto, isso pode mudar de acordo com alguma necessidade particular de cada paciente, que pode ser identificada nas consultas com o anestesiologista ou com o infectologista.

A cirurgia é feita por via laparoscópica, ou seja, por meio de seis incisões no abdome, por onde são introduzidas as pinças e a câmera que permitem a colocação dos eletrodos em sua posição adequada, junto dos nervos pudendos, ciáticos e femorais dos lados direito e esquerdo. 

Uma outra incisão de seis centímetros é feita na pele, na região inferior e mais lateral do abdome — pouco abaixo da linha do umbigo — para colocação do aparelho neuroestimulador cerca de dois centímetros abaixo da pele. 

A escolha do lado da implantação do neuroestimulador depende dos hábitos de massagem intestinal e da sensibilidade do paciente e serão discutidos antes da cirurgia, nas consultas pré-operatórias. 

Ao fim da cirurgia o paciente é encaminhado para uma sala de recuperação por algumas horas, e depois segue para o quarto. Neste período o mesmo poderá mudar de posição, tomar banho, realizar as sondagens, se alimentar e fazer transferências com cautela, seguindo rigorosamente as orientações ensinadas durante a Fase 1. 

A enfermagem estará orientada sobre as particularidades do procedimento realizado e poderá auxiliar com as mudanças de posição e com os cuidados necessários.

O tempo de internação dura, em geral, de dois a dez dias, a depender do esquema de antibióticos necessários e da recuperação adequada após o procedimento. Em caso de complicações pós-operatórias, esse período pode ser prolongado. 

Durante a internação, a equipe médica realiza visitas diárias para acompanhamento e programação do aparelho no momento adequado. Em geral, ativa-se o aparelho no primeiro ou no segundo dia após a cirurgia. Neste momento, também serão dadas orientações sobre a recarga e cuidados com o aparelho.

Uma vez recuperado, o paciente terá alta e irá para seu domicílio, onde manterá os cuidados iniciais de restrição de alguns movimentos e esforços. Além disso, já deverá iniciar a ativação do aparelho e alguns exercícios orientados e treinados ainda durante a internação. 

Qualquer intercorrência, dúvida ou incidente durante os dias de recuperação inicial devem ser imediatamente comunicados à equipe para que novas orientações e as providências adequadas sejam prontamente tomadas.

Por volta do 15º dia retiram-se os pontos cirúrgicos e realiza-se uma nova avaliação para o início do programa de reabilitação na clínica, envolvendo toda equipe multidisciplinar e multiprofissional. 

Fase 3: reabilitação pós-operatória

Nesta fase, a reabilitação é estruturada para maximizar os ganhos na reabilitação utilizando recursos da neuromodulação com uma ferramenta facilitadora/otimizadora.

Nos primeiros três meses, visa-se ao ganho de massa muscular, condicionamento cardiorrespiratório e à adaptação do paciente ao uso do neuromodulador. Além disso, realiza-se a reabilitação do assoalho pélvico buscando melhora da função urinária, intestinal e sexual. Nesta fase, observamos expressivos avanços na consciência corporal e na autoestima. 

Após este período, inicia-se o treino de ortostatismo (ficar em pé). Esta fase progride à medida em que o paciente adquire consciência corporal e passa a reaprender a distribuir o peso do corpo nos membros inferiores e a corrigir a postura ao ficar de pé. 

Além disso, será trabalhada a adaptação cardiorrespiratória a essa nova condição, pois muitos pacientes têm episódios de queda de pressão ao ficarem em pé nesta nova fase. A Fisioterapia Cardiorrespiratória é fundamental para esta adaptação.

Depois desta fase de treinamento para o ortostatismo, iniciaremos a fase de treino de marcha. O treinamento começa na piscina e/ou nas barras paralelas, progredindo para o andador em ambiente interno (marcha terapêutica) e finalmente marcha em andador em ambiente externo (marcha funcional). Alguns pacientes chegam a conseguir caminhar com muletas.

O objetivo principal da fase 3 é promover a independência do paciente. Vale ressaltar que o tipo e o nível da lesão medular irão influenciar diretamente na evolução e alguns pacientes podem não ter condições de atingir a marcha funcional. 

A cada três meses elaboramos um novo plano terapêutico individualizado, com metas objetivas para cada área da reabilitação. Essas metas são expostas ao paciente para que saiba onde acreditamos que possa chegar naquele período, alinhando suas expectativas com as da equipe. Isso ajuda o mesmo a manter-se focado, diminuindo a ansiedade quanto à sua evolução.

Caso o paciente não apresente ganhos funcionais em duas avaliações (período de seis meses), consideramos que tenha atingido o limite de reabilitação pela técnica e iniciamos então o processo de transição do paciente para a rede do convênio.

Na quarta e última parte desta série falaremos sobre as normas para o atendimento e as dúvidas mais frequentes. Fique de olho, não deixe de acompanhar o nosso conteúdo!

Confira também as partes 1 e 2 desta série.